Porque grandes garotas não choram. Elas escrevem.

Cruzou fronteiras e ainda estava em casa

segunda-feira, 15 de junho de 2015





English version on the end

Era uma família comum, nos subúrbios de Chicago.

Namoraram muitos anos, compraram uma casa, se casaram, e decidiram encher ainda mais suas vidas com amor. A primeira filha, Mae, chegou, preenchendo qualquer vazio que pudesse existir. Em sua fragilidade, precisava ser cuidada e protegida. E, em sua excepcionalidade, precisava estar cercada por todo o amor que existe no mundo. Sabiam que tinham ternura de sobra e que ela seria mais feliz, se não estivesse sozinha. A linda e brilhante Isla veio, então, ao mundo, para deixa-lo mais belo, mais doce, mais desafiador. Que família linda se tornaram! Mas ainda existia espaço. Ainda existia o desejo e a disponibilidade para amar mais um pouco, para cuidar mais um pouco. Leo chegou. O pequeno herói, de olhos inacreditáveis e bochechas rosadas, completou o clã. A partir dali, só existiria amor, felicidade e gratidão na casa cor-de-rosa, no fim da rua.


Era uma garota comum, no interior do Rio de Janeiro.

Enquanto tudo isso acontecia, ela sonhava acordada. Ensino médio, curso técnico, faculdade. Estágios, estágios e mais estágios. Sentia saudade de tudo o que ainda não tinha vivido. Sentia que conhecia apenas uma pequena parte do todo. E que o todo era grande demais para ela se conformar apenas com aquele pedacinho. Ela sabia que algo lá fora chamava por ela. Ela podia ouvir. Barcos não foram feitos para ficar no porto, ela repetia. Escutava essa voz e, um dia, decidiu responder. Iria para os Estados Unidos.



Nos primeiros e-mails trocados, a afinidade já podia ser vista. Uma conversa no Skype, e estava evidente: queria viver com esta família. Alguns meses depois - não muitos -, e lá estava ela, desfazendo suas malas em seu novo quarto, cuidadosamente decorado, com fotos de sua família e amigos. Na escrivaninha, vários cadernos em branco. Cada capa com um motivo diferente. Um para lembranças dos amigos que faria. Outro para desabafos e confissões ao longo da estrada. E tantos outros. Cada traço da sua personalidade, que ela deixou transparecer nos meses de conversa online, estavam presentes. A atenção e cuidado aos detalhes podiam ser vistos desde o primeiro momento. A linda família não media esforços para garantir que ela se sentiria em casa. Aquele seria um ano maravilhoso, tinha certeza.


Não sabia explicar em que momento sua melhor amiga se tornou uma irmã. Assim como não se lembrava quando as crianças se tornaram parte de seu coração, quando sua host mom se tornou sua confidente e quando começou a se sentir, de fato, amada como parte da família. Sabia apenas que, se não tivesse ouvido aquela voz, não saberia que é possível amar tanto pessoas que acabaram de chegar em sua vida. Não conhecia o tamanho de seu coração, até se ver chorando porque uma das crianças estava doente e ela não podia ajudar. Não sabia que qualquer lugar podia ser chamado de lar, quando você se sente amado.



Não é fácil morar com seus chefes. Não é fácil mergulhar de cabeça na rotina de uma família em uma cultura diferente. Não é fácil separar as coisas. Exige esforço, compreensão e maturidade. Exige que você reconheça que, muitas vezes, as pessoas sabem mais do que você. Exige que você esteja aberta a aprender, a relevar, a escolher suas batalhas. Quanto crescimento a gente alcança, quando deixa a zona de conforto e abraça o mundo com todas as suas possibilidades. Quanto amor podia ser encontrado depois de cada curva que a gente se recusa a fazer na vida, porque ir apenas em frente parece ser mais fácil. Quanta gratidão ela tem, hoje em dia, por tantos planos que não deram certo. Uma curva arbitrária ao longo do caminho, e ela poderia estar em outro lugar.

Para ela, eles nunca mais seriam uma família comum, nos subúrbios de Chicago. Não importa onde ela esteja, eles serão sempre a parte de si própria que ela descobriu e aprendeu a amar.



"Você nunca vai se sentir completamente em casa novamente, porque parte do seu coração sempre vai estar em outro lugar. Esse é o preço que você paga pela riqueza que é amar e conhecer pessoas em mais de um lugar."
English version

Crossed borders and yet was home

They were a just one more family, in the suburbs of Chicago

They dated for many years, bought a house, got married and decided to fill their lives with even more love. The first daugther, Mae, came, fulfilling every empty spot that might have existed. In her fragility, she needed to be cared and protected. And, in her exceptionality, she had to be surrounded by all the love existing in the world. They new they had plenty of affection and she would be happier, if she was not alone. The beautiful and bright Isla, came, then, to the world, to make it prettier, sweeter and more challenging. What a beautiful family they became! But there was still room. There was still a longing and willingness to love even more, to care even more. Leo came. The little hero,with his unbelieveble eyes and big cheeks, completed the clan. From that day on, there would only be love, happiness and gratitude in the pink house in the end of the street.

She was just one more girl, in a small town in Rio de Janeiro

While all of that happen, she was daydreaming. High School, Technical School, university. Internships, internships and more internships. She used to miss everything she hadn't lived yet. Felt like she knew only a small piece of the whole. And that the whole was too big for her to settle only with that tiny little piece. She knew something out there was calling for her. She could her it. Ships were not made to stay in the harbor, she repeated to herself. She could hear that voice and, one day, she answered. Was going to the United States.

Since the few first emails, could feel the closeness. Only one Skype call, and it was decided: she wanted to live with that family. Few months later - not many -, she was there, unpacking in her new room. A room, thoroughly decorated, with pictures of her family and friends. On the desk, several journals. Which cover brought a different purpose. One for the memories she was gonna collect with her new friends. Another one for confessions and secrets when in the road. So many. Every part of her personality were present in that room. The attention and the care to details could be seen since the first moment. The beautiful family did not mean efforts to make sure she would feel like home. That was gonna be a wonderful year, she was sure.

She didn't know when her best friend became her sister. The same way she didn't remember when the kids became part of her heart, when her host mom became her confident, and when she really started feeling loved as a part of the family. She only knew that, if she hadn't heard that voice she would never know that's possible to loving so much people that just got into her life. She didn't know how big was her heart until she saw herself crying because one of the kids were sick and she couldn't help. She didn't know that any place can be called home, when you feel loved.

It's not easy to live with you boss. It's not easy to jump into a family's daily routine living in another culture. It's not easy to separate things. It demands endeavor, understanding and maturity. It demands you recognize that, many times, people know better than you. It demands you're open to learn and to pick your battles. How much we grow when we leave out comfort zone and embrace the world with all its possibilities. How much love we could find after every turn we didn't take, only because going straight is easier. How grateful she is now for all the plans that didn't work before. One arbitrary turn alone the way and she would be elsewhere.

For her, they would never be just one more family in the suburbs of Chicago. No matter where she goes, they will always be a part of herself that she got to know and learned how to love.





Read more...

Da necessidade de declarar esse amor por você

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Enquanto houver você do outro lado, aqui do outro, eu consigo me orientar
Sei que a proximidade não nos fazia bem, e que, talvez, a distância tenha sido nosso maior presente. Mas não posso deixar de falar sobre a falta que você me faz.
Desde que você contava mentirinhas para me fazer de boba e que fazíamos perfumes com as folhas frescas de hortelã roubadas dos pés que a Dona Sônia plantava... desde sempre, eu quis ser como você.
Eu sonhava em ter sua inteligência, suas habilidades, seu tom de pele, e até a sua voz. Irmão mais velho quase sempre é espelho, né? E eu não fugi do clichê.
Sou grata pelas qualidade que absorvi de você. Sou grata pela inconstância, pelo inconformismo, pela inquietude e por essa paixão que não nos deixa parar.
Você talvez não saiba, mas é minha inspiração. Ainda bem que tenho você. Porque, sem o seu exemplo, eu talvez não fosse tão independente. Sem os nossos choques, nenhuma de nós seria tão forte. E, sem o seu incentivo, eu talvez não tivesse tanta fé em mim.
Nada é tão palpável quanto a certeza de que eu sou tudo o que eu sou porque tive a sorte de ter você.
Acho que alguns dos nossos anjos são assim mesmo: vêm disfarçados para a gente aprender a amar e descobrir que não existe no mundo força maior que a desse laço.

Te amo, irmã

Read more...

Sobre as marcas que ficam

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Por Brena Lacerda

 
Toda violência, seja ela física ou não, deixa cicatrizes. Cada vítima carrega as suas e elas nunca são iguais. Dor não se mede, trauma não se quantifica e ninguém pode precisar o peso que cada um traz nos ombros. Algumas vezes, a dor de um acontecimento pode reacender uma mágoa passada, que pensávamos estar esquecida, superada. Algumas vezes, palavras de consolo, empatia e o tão atarefado tempo não são suficientes. Nada é. Certas cicatrizes são eternas.
Há algumas noites, no caminho da faculdade até o ponto de ônibus, pouco depois das dez, uma amiga e eu conversávamos na rua em que ela mora. Notando que já estava um pouco tarde, nos despedimos e seguimos caminhos opostos. Eu precisaria andar menos de três minutos até o ponto de ônibus que estaria cheio de trabalhadores e estudantes voltando para casa.
Após o que pareceu cerca de 30 segundos depois da despedida, fui seguida por dois homens dos quais não vi o rosto, apenas ouvi as risadas. Com o tempo passando supreendentemente devagar, senti uma forte puxada no braço, da qual consegui me soltar. Ao tentar correr, um dos sujeitos agarrou minha saia rodada e segurou meus braços. Meus gritos não eram ouvidos. Eu só pensava no que estava para acontecer e em como eu preferia morrer ali a ser violentada de tal forma. Usei toda a força que tinha me debatendo. Consegui soltar um dos braços que se chocou contra a porta de aço de uma loja. O barulho assustou meu agressor que, por um segundo, soltou meu outro braço. Foi o tempo que precisei para correr, atravessar a principal e mais movimentada avenida da cidade e chegar ao ponto de ônibus, aonde fui amparada por alguns amigos e pude telefonar para minha mãe.
Em meio a todo o choque da violência sofrida, do choro que vai e vem e do medo de todos que não conheço, tenho ouvido tentativas de consolo como ‘não fique assim, poderia ter sido bem pior’. Mas, na minha concepção, saber que poderia ter sido pior é o que mais machuca. Se o que aconteceu já me despiu de qualquer desejo de pôr meus pés para fora de casa pela manhã, como eu me sentiria se aquela violência tivesse chegado a níveis extremos? Eu não saberia responder. Não tenho o direito de dizer que entendo ou que imagino a dor de uma pessoa violada a tal ponto. Sei apenas da minha dor, e ela não tem cabido no peito.
Passei os últimos oito anos me recuperando do trauma de um assédio sexual sofrido dentro da minha própria família, no início da minha adolescência. Em minhas análises posteriores ao ocorrido, sempre me questionei sobre em que momento permiti que tal coisa acontecesse. Foi culpa minha, que me desenvolvi muito cedo e sempre chamei atenção? Foi culpa minha, que não notei o interesse, supostamente, explícito? De alguma forma, a culpa era minha, não do homem 30 anos mais velho do que eu que, abusando da confiança da minha família, pensou que tinha o direito de me tocar e satisfazer seus desejos, quaisquer que fossem eles.
A nova agressão trouxe de volta grande parte da frustração adormecida. Mas, desta vez, talvez pela idade ou pela experiência, estou certa de que, se não fosse eu naquela rua, teria sido outra. Se não fosse eu naquele carro, oito anos atrás, teria sido outra. Não foi o adiantado da hora, não foi a minha saia rodada, não foi minha meia-calça preta. A única causa da violência foi a prepotência dos meus agressores, que, ao verem uma jovem sozinha em uma rua vazia, se sentiram no direito de invadir o meu espaço, me tocar e tentar, a força, conseguir algo de mim.
É bastante óbvio, mas a sociedade ainda precisa ouvir: quem causa um estupro é apenas o estuprador. E é vítima, e não ré, a mulher ou menina que é julgada como presa fácil e submetida a este tipo de tortura. Talvez, algum dia, a dor passe, a cicatriz fique mais fraca, quase impossível de se ver, e fique mais fácil voltar a andar com confiança. Talvez, algum dia, as pessoas entendam que meu corpo pertence a mim e que é um crime contra a humanidade sequer pensar em me tocar sem a minha permissão. Talvez um dia, as pessoas saibam e nós não precisemos mais dizer.

Read more...
"É preciso ter força para esconder os próprios males, mas é preciso coragem para demonstrá-los"

  © Blogger template Brownium by Ourblogtemplates.com 2009

Back to TOP